Entrevista Andresa Pradella - Luiz Gianesini

De Sala Virtual Brusque
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A entrevistada desta semana é a Educadora Social Andresa Pradella, nascida em Brusque, aos 05/03/1980; filha de Lurdete Soares.

Quais as atribuições de seu cargo?

Meu cargo se baseia no acolhimento dos usuários da SASH - Secretaria de Assistência Social e Habitação- mas no momento estou atuando no Bolsa Família, atualizações de cadastros, busca ativa de famílias com dados cadastrais desatualizados.

Sonho de criança?

Pelo que lembro não tive um sonho específico em o que querer ser

Ainda cultiva amizades do tempo da infância?

sim, meus amigos são meu porto seguro, tenho amigos do tempo do jardim de infância, amigos são a família que nós escolhemos, então nada melhor que cuidar da nossa segunda família.

Como foi sua vida escolar?

Foi como a de um adolescente qualquer, com bagunças, turmas barulhentas....rsrsrs...Sempre me empenhei muito para ter boas notas, mas gostava mesmo de uma boa conversa no fundão.

Quais escolas frequentou?

Frequentei o Dom João Becker até o terceirão, Magistério no Honório Miranda e Educação Especial pela UDESC.

Pessoas que a influenciaram?

Minha mãe que sempre me mostrou que força temos, basta querer encontrá-la em nosso interior; Meu avô Antônio Pradella, dono de um caráter sem igual, me ensinou que ninguém é melhor que ninguém, e que se um ser humano não for humilde nunca chegará a lugar algum; Minha Biza que me mostrou que mãe não se tem só uma; minhas irmãs Ariana e Narjara que fazem parte do meu dia a dia me apoiando e me presentearam com os maiores amores da minha vida, que são os meus sobrinhos; e Dona Rita e seu Guido Sassi e família, com eles aprendi que ser grande não é ser alto, e sim é ter espirito são e alma limpa, que com nossos esforços podemos alcançar o que almejamos, mas nunca, em hipótese alguma, perca seu caráter no caminho.

Quando ingressou no Município? Concursada?

Em maio deste ano, concursada.

Tivemos um Prefeito que disse que só fica na Prefeitura os incompetentes. Você concorda?

Acho que se só ficassem os incompetentes a população já teria se manifestado, é a visão dele, na minha fica aqui quem quer, quem gosta. Temos um leque muito grande de concursos, mas sabemos que nossa cidade é um lugar maravilhoso para se viver, então, fica na prefeitura quem gosta do seu trabalho, gosta da sua estabilidade e da cidade.

O que poder-se-ia fazer para que os efetivos não fiquem tão convencidos de que são imexíveis?

Acho que não cabe a mim esta resposta, mas temos que estar conscientes de que estamos no serviço publico para bem atender nossa população, se eu sou efetiva e por conta disso não fazer meu trabalho com dignidade, quem deve me punir deve ser a minha consciência. Tanto os cargos comissionados quanto os efetivos devem ter a sabedoria de que ninguém insubstituível, e que se estamos onde estamos, é para dar o melhor de nós.

Como surgiu o "autismo" em sua trajetória?

Surgiu na APAE e depois disso me filiei ao AMA - Associacão dos amigos dos autistas onde fiz vários cursos e especialização em autismo.

O que autismo?

O autismo é caracterizado como uma forma de transtorno de desenvolvimento global, também chamada de síndrome da Tríade, pois é caracterizada por três fatores fundamentais: Prejuízos qualitativos na Interação Social; - contato visual; expressões faciais; relação com os pares; compartilhamento de satisfações; reciprocidade emocional; Prejuízos qualitativos na Comunicação; aquisição da linguagem; iniciação e manutenção de conversas; linguagem repetitiva e estereotipada; jogos sociais (faz-de-conta); Padrões restritos e repetitivos de comportamento, interesses e atividades; preocupação insistente em interesses restritos; resistência a mudanças na rotina; estereotipia motora repetitiva; preocupação excessiva com partes de objetos.

O autismo é um transtorno de nascença?

O problema é congênito, podendo ser notado quando o comportamento da criança se afasta do normal, levando à suposição de deficiência auditiva (não atende a ordens, vocabulário pobre, dificuldade de expressão verbal), fixação em atividades repetitivas, irritabilidade, geralmente por volta de 2 a 3 anos de idade. A variabilidade o quadro é muito grande, e a tendência é que um grande número de crianças sejam diagnosticadas como portadoras da síndrome autista antes que avaliações mais acuradas determinem problemas mais específicos, como surdez, dislalia, déficit de atenção e hiperatividade, déficit profundo do desenvolvimento, etc. Também à medida que a síndrome é melhor conhecida vão sendo descobertas e experimentadas terapias cada vez mais eficazes, com inúmeros casos de superação de deficiências específicas.

O que pode ser feito para amenizar a situação do autista?

Para amenizar situação do autista são dados medicamentos ansiolíticos, e tratamento pedagógico. Dentro do âmbito escolar e familiar, devemos trabalhar com dois métodos básicos e fundamentais: - O método TEACCH - Teacch (Treatment and Education ofAutistic and Related Communication Handicapped Children), que em português significa Tratamento e Educação para Autistas e Crianças com Déficits Relacionados com a Comunicação - são utilizados estímulos visuais (fotos, figuras,cartões), estímulos corporais (apontar, gestos, movimentos corporais) e estímulos audiocinestesicovisuais (som, palavra, movimentos associados às fotos) para buscar a linguagem oral ou uma comunicação alternativa . Por meio de cartões com fotos, desenhos, símbolos, palavra escrita ou objetos concretos em sequência (p . ex ., potes, legos etc.), indicam-se visualmente as atividades que serão desenvolvidas naquele dia na escola . Os sistemas de trabalho são programados individualmente e ensinados um a um pelo terapeuta. Quando a criança apresenta plena desenvoltura na realização de uma atividade (conduta adquirida), esta passa a fazer parte da rotina de forma sistemática. O método PECS: O Picture Exchange Communication System ou em Português, Sistema de Comunicação por Troca de Figuras, consiste em um método para ensinar com autismo, a comunicarem-se de forma funcional, por intermédio da troca de figuras. Existem outros métodos como o Programa Son Rise, mas basicamente usamos estes dois.

O autista é propenso à depressão?

O autista não é propenso a ser depressivo, pois vive "em seu mundo". A aprendizagem se dá através da repetição, e como não ensinamos o que é dor, raramente um autista vai chorar por conta dela, assim acontece com a depressão, ele não sabe o que é, então, não te como desenvolvê-la.

Como Surgiu a Língua Brasileira de sinais e sua carreira?

Também na Apae, achava encantador , então resolvi fazer curso na Feneis, fiz 3 anos.

Comente sobre a linguagem por sinais

A LIBRAS (Língua Brasileira de Sinais), que teve sua origem na língua de sinais francesa, é uma forma de comunicação das pessoas deficientes auditivas e foi reconhecida como a segunda língua oficial do Brasil pela lei nº 10.436, de 24 de abril de 2002 pelo Presidente Fernando Henrique Cardoso, mas os surdos já se comunicavam através dela, pois existe no Brasil desde 1896. Cerca de 90% da população Surda se comunica através dela, porém muitos fonoaudiólogos descriminam a LIBRAS, pois surdos com implantes tem a possibilidade de desenvolver a fala por estarem escutando, mas eu acho que sem a LIBRAS não somos capazes de alfabetizar, pois mesmo com implantes os surdos escutam um som mecânico.

O Alfabeto é constituído por imagens?

As imagens não constituem um alfabeto, assim como temos o alfabeto digital, nas LIBRAS temos o alfabeto manual, que consiste em formar letras com as mãos.

Aproximadamente, quantas pessoas temos com problema de audição?

07- Os últimos dados que temos, são do senso de 2000 nacional que indicava que no Brasil haviam cerca de 5.750.805 surdos.

Existe uma técnica para apresentar uma frase usando sinal para cada letra?

Não. As letras surgem apenas para designar nomes, siglas, os sinais representam objetos, alimentos, vestuário, idade.....

Fale um pouco de sua trajetória profissional e da sua história de vida?

Minha trajetória profissional com crianças começa aos 9 anos de idade, quando comecei a trabalhar de babá, dos netos do Seu Guido. Depois trabalhei na panificadora Sassipan. Com educação comecei no SESI em 1997, fazendo estagio do Magistério, em 1998 além do SESI, comecei a trabalhar na APAE, onde descobri o amor pela educação especial. Meu primeiro momento no ISI (Instituto Santa Inês), popular APAE foi um pouco dificil, pois imaginava que APAE atendia apenas crianças com SIndrome de Down, quando me deparei com a realidade foi desesperador. Mas depois de uma semana, o desespero começou a dar lugar ao carinho e ao amor intenso que recebia e dava a aquelas pessoas. De 1998 a 2002, vivi um dos períodos mais felizes e gratificantes da minha vida, aprendi muito dentro da APAE, cresci como ser humano, comecei a ver o mundo com outros olhos e a encarar os fatos de outra maneira. Fiz amigos que conservo até hoje e os alunos ainda lembram de mim. Depois disso, meu trabalho passou para o ensino regular, onde fiquei até 2009 pelas escolas do nosso municipio. Em 2011 uma porta maravilhosa se abriu para mim, a Escola de Educação Basica Monsenhor Gregório Locks, onde pude por em pratica todo meu aprendizado para autistas, passei la dois anos e meio e o meu trabalho tanto com autista, como os demais alunos foi grandioso, me tornei amiga de muitos adolescentes com problemas sociais e sem problemas, desde o primeiro aninho até o terceirão, os alunos eram minha dose diária de alegria, amor e aprendizado. Hoje em dia, quando tenho um tempo ainda vou lá para dar um cheiro e ganhar abraços cheios de boas energias.

Algo que você apostou e não deu certo?.

Apostar talvez seja muito forte, afinal não jogamos com a vida, temos o poder de tomar decisões e estas decisões valerem ou não nossos esforços. Já tomei muitas decisões erradas, mas nada que não tenha vindo acrescentar algo em minha vida.

O que faria se estivesse no inicio da carreira e não teve coragem de fazer?

Sempre fui muito objetiva, busquei as coisas, tracei metas. Algumas não alcancei, e acho que eu seria menos "bocuda", teria me preocupado mais comigo ao invés de defender as pessoas do meu convívio. Hoje me policio bastante para não defender as pessoas, apenas aconselhá-las.

O que você aplica dos grandes educadores, das aprendizagens que teve, no seu dia a dia?

Não digo que sejam grandes pensadores Piaget, Vygotsky, Frenet....na minha opinião são linhas comerciais que na teoria são lindas, mas que na pratica não funcionam muito. Prefiro aplicar a experiencia, também os métodos dos programas para autistas funcionam muito bem, mas tem que ser adaptados a realidade da família e ambiente escolar. Gosto muito de Friedrich_Nietzsche, pois tem uma visão realista e categórica de mundo em suas literaturas, podemos aplicá-las adaptando a linguagem para que o mundo não assuste quando as crianças tiverem que lidar diretamente com ele.

Quais as maiores decepções e alegrias que teve?

Decepções temos todos os dias, seja com o pão que não estava com o sabor de sempre até a chuva que cai quando você acaba de sair do cabeleireiro. Algumas decepções são impossíveis de esquecer e irreparáveis, perder pessoas do seu convívio por falta de lealdade é uma das coisas que mais me chateiam, sou muito sincera, as vezes até demais, e espero isso das pessoas, mas nem sempre acontece. Mas acho que a maior decepção que tive foi quando escutei de um médico que não poderia ter filhos, sempre falei que não queria ser mãe, que não tinha a maternidade aflorada e tal, mas entre não querer e não poder existe um abismo, e é ai que você se sente impotente perante a sua natureza, pois está indo de contra a ela, a natureza da mulher é ser mãe, e eu jamais poderei gerar outra vida dentro de mim, em contrapartida minhas maiores alegrias são meus sobrinhos, meus pilares, meus amores. Tenho três, mas a gravidez do primeiro sobrinho foi a mais acompanhada, a mais desejada e a mais alegre, participei de todos os momentos da gestação do João, cheguei a enjoar junto com minha irmã, e a emoção de vê-lo foi indescritível, parei na porta do quarto onde estava minha irmã deitada com ele do lado, eu não sabia se corria, se entrava no quarto, se chorava ou se sorria, pensei até que desmaiaria de tanta felicidade, de ver aquele ser tão indefeso podendo sentir tanta segurança nos meus braços. Todos os três nascimentos me deram alegria, mas acho que a emoção de ver meu primeiro sobrinho pela primeira vez não tem como ter outra. João hoje está com 12 anos, fase adolescente, mas meigo, muito companheiro, Henrique fez 5 anos, meu xodó, inteligente, engraçado e meu amorzinho, as vezes penso que se fosse meu, não seria tão parecido, minha irmã me propicia muita cumplicidade com eles, chego a me sentir um tipo de "mãe emprestada", que está ali para dar colo, chorar junto e dar broncas quando consigo. Minha irmã mais nova me deu outro presente, quando achei que pudesse ser mãe, sempre sonhei com uma menina, e ela veio, não de mim, mas da minha irmã, dez anos mais nova que eu. Minha Júlia, doce, meiga e 'espuletinha', tem 7 meses e é a minha menina.

Qual foi o maior desafio até agora?

Meu maior desafio até hoje foi ter que enfrentar a anorexia de frente, no âmbito pessoal. No profissional, todos os dias encontro novos desafios, afinal trabalhar dentro de uma Secretaria de Assistência Social nos leva a enfrentar situações que não estamos habituados, então cada pessoa que chega para ser atendida, tem sua história de vida, seus problemas e como estamos ali para acolhê-las sinto a obrigação de muitas vezes me colocar na situação da pessoa e ver que a minha vida abençoada.

Você se arrependeu de alguma coisa que disse ou que fez?

Varias vezes, o erro é passível do ser humano, e o erro traz amadurecimento.

Qual a sua maior aspiração?

Neste momento seria trazer um AMA (associação dos amigos dos autistas) para Brusque e região

Referências

  • Entrevista publicada no EM FOCO aos 25 de outubro de 2013.