Entrevista Edemar Leopoldo Schlösser - Luiz Gianesini

De Sala Virtual Brusque
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Nosso entrevistado, Dr Edemar L. Schlösser.

O entrevistado da semana é o Juiz Dr Edemar Leopoldo Schlosser, natural de Sobradinho/RS, nascido aos 13.11.1953; filho de Oswaldo e Vilma Matilde Schlosser; casado com Eloni Fátima aos 11.12.1978. Três filhos: Daiana, Ricardo Diogo e Luciano Henrique. Formado pela Faculdade de Direito de Cruz Alta/RS. Atuou como advogado por 14 anos na Comarca de Pinhalzinho/SC. Ingressou na Magistratura em 13.01.93.

Algum motivo especial para ingressar na magistratura? Há algum precedente familiar?

Na verdade advoguei por 14 anos e durante esse convívio profissional conheci vários magistrados que acabaram me incentivando para que ingressasse na Magistratura, entre eles o meu colega Dr Cláudio Valdyr Helfenstein. Não possuo nenhum familiar que faz parte da Magistratura ou do Ministério Público

Edemar L. Schlösser e família.

Acompanhamos pela imprensa casos cada vez mais escandalosos e chocantes de violência aqui em Brusque. O senhor acredita que têm aumentado a violência na cidade?

Se for considerado o contexto regional e estadual, posso afirmar que não, pois em comparação a cidades vizinhas de Blumenau, Itajaí, Balneário Camboriú, Camboriú, entre outras, verifica-se que o índice de criminalidade de Brusque está abaixo da média. Entretanto, não se pode ignorar o crescimento populacional, pois há dez anos atrás Brusque tinha uma população de 73.000 habitantes, enquanto hoje, são quase 110.000 habitantes, sem olvidar o forte crescimento populacional de Guabiruba, município que também compõe esta comarca.

Quando a sociedade pede o agravamento das penas ela quer dizer que a última instância (Judiciário) precisa agir como se fosse a primeira?

O aumento da pena não é sinônimo e nem garantia da diminuição da criminalidade. O exemplo está na Lei que instituiu os crimes hediondos, e recentemente, o tráfico de drogas e os crimes de estupro de vulnerável, que tiveram agravadas as penas, porém, o que se vê na prática, é um aumento de tais crimes. A justiça de 1º Grau, por ser mais próxima aos fatos, quase sempre consegue dar uma resposta mais rápida à sociedade. Já o excesso de recursos previstos em lei, torna lento e burocrático o julgamento, contrariando o princípio da celeridade processual e da efetividade da pena.

Sobre a política de segurança pública no município. É no município, de forma geral, que as coisas acontecem. O que falta para que ela seja consistente?

Na comarca de Brusque obtivemos avanços consideráveis em termos de segurança pública, a começar pela melhora na estrutura administrativa, física e de pessoal, com a instalação da Delegacia da Mulher e da Unidade Prisional de Brusque –UPA, hoje mantendo uma média de 120 presos. Importante destacar ainda, a harmonia entre a Polícia Militar e Polícia Civil, cada qual cumprindo suas atribuições, mas ambas comprometidas com o combate a criminalidade.

Talvez no momento, a maior carência é a falta de um Centro de Internação para menores infratores, para aqueles que se envolvem com ilícitos graves e por vezes são liberados pela justiça por falta de local ou vaga para internação.

Alberto Antonio de Moraes Carvalho disse que "A vingança, que o cidadão toma por suas próprias mãos, é uma usurpação das atribuições do juiz, e do carrasco", seria em função da demora na aplicação da justiça?

Justiça que não é célere e eficiente, não é justiça. Por óbvio, não se pode conceber que a deficiência do Poder Judiciário permita ao cidadão fazer justiça pelas próprias mãos. Contudo, não se pode negar que a sensação de impunidade faz com que o corpo social desacredite nas leis e no judiciário, contribuindo para o aumento da criminalidade, com um todo.

Na condição de juiz da Vara Criminal da comarca de Brusque tenho me empenhado diuturnamente para que as ações penais fluam com rapidez, dando uma resposta imediata a sociedade, apesar do grande número de processos que nela tramitam.

O senhor acha que a prescrição de pena é resultado de uma falha na legislação ou na falta de estrutura do Poder Judiciário?

A prescrição penal é a perda do poder de punir do Estado, causado pelo decurso do tempo fixado em lei. Nosso ordenamento jurídico prevê o instituto da prescrição e acho importante, porquanto o cidadão que comete um crime não pode ficar à mercê e pagar pela omissão ou inércia do Estado. A Lei n. 12.234, de 5/5/2010 aumentou o prazo da prescrição mínima de dois para três anos.

É comum ocorrer prescrição nos processos que tramitam aqui na comarca?

Em razão do trabalho da Vara Criminal de Brusque são poucos os processos abrangidos pela prescrição. Seu reconhecimento ocorre com mais frequência em crimes cujas investigações para apuração da materialidade e indícios de autoria são mais difíceis e demoradas; quando as penas previstas ao tipo penal são menores; quando, por razões diversas, a instrução criminal é mais demorada; e naqueles processos envolvendo menores de 21 anos e maiores de 70 anos, cujo prazo prescricional é reduzido pela metade (art. 115, CP).

Tenho observado um aumento de mulheres infringindo a lei tanto quanto os homens, na parada nas faixas de pedestres, no uso do celular contribuindo para a direção perigosa, na bebida, o que poderia estar motivando esse fenômeno?

A melhora do poder aquisitivo da população e a facilidade de acesso a aquisição de veículos, motocicletas e similares, contribuiu para a elevação de circulação de veículos em nossas vias públicas, e consequentemente, para o aumento das infrações de trânsito.

Ao menos na Vara Criminal de Brusque, o índice estatístico de homens autores de infração de trânsito, como homicídio culposo, lesão corporal ou embriaguez na direção de veículo automotor é bem superior das mulheres, numa proporção de quase dez por um.

De um lado a sociedade desamparada conforme constatado pelos níveis de violência; de outro o jovem infrator que vem de famílias desestruturadas. Em relação à maioridade penal, a população pede mais rigor da lei, enquanto aplicadores do Direito defendem o contrário. Com quem está a razão?

Assim como a Lei dos Crimes Hediondos (nº 8.072/90), que agravou penas e o regime prisional, vedou a concessão de fiança e liberdade provisória, entre outras restrições, não inibiu e nem freiou a prática daqueles crimes mais graves, como tráfico, homicídio qualificado, latrocínio, extorsão e estupro de vulnerável, não há dúvida de que a diminuição da delinquência juvenil não se restringe somente a necessidade de redução da menoridade penal.

Com cadeias, presídios e penitenciárias superlotadas, sem cumprir com sua finalidade de reprimir e ressocializar, milhares de mandados de prisão expedidos e não cumpridos, será que a simples redução da idade penal é a solução?

O menor infrator é produto do meio em que vive, e enquanto aumentar a desigualdade social e desestrutura familiar, não haverá mágica que o legislador possa criar para solucionar o problema.

E depois, não se pode olvidar a omissão do Estado na criação e estruturação de Centros de Internação para menores infratores. Aliás, na comarca de Brusque foi necessário a concessão de medida liminar proibindo que adolescentes infratores fossem “jogados” em celas comuns enquanto aguardam vaga.

O legislador brasileiro adotou o critério etário. A delinquência praticada por jovens aumenta a cada dia. O senhor considera que uma alteração do Código Penal e do ECA são caminhos para redução da violência?

A delinquência juvenil aumenta assim como toda a criminalidade. Tributar a responsabilidade pelo aumento da criminalidade ao menor infrator me parece ledo engano. Dados estatísticos confirmam que, em proporção a população, a delinquência praticada por jovens é bem inferior àquela envolvendo os penalmente responsáveis. As alterações das leis são necessárias, entretanto, a justiça somente ocorre quando ela é célere e eficaz, pois de nada adiante o juiz “fazer de conta que está punindo e o réu fazer de conta que está cumprindo sua pena e pagando seu erro perante a sociedade.”


O senhor acredita em alguma manobra para enveredar a opinião pública em um temor generalizado com vistas à aplicação da pena de morte e prisão perpétua?

Não. Pelo espírito democrático da população brasileira, não me parece ser possível a alteração da legislação neste aspecto, ao menos por enquanto. Aliás, para instituir a pena de morte ou prisão perpétua seria necessária a alteração da Constituição Federal, que veda tais sanções em seu art. 5º, XLVII, ‘a’ e ‘b’.

O que o senhor pensa sobre a tese de Cesare Beccaria que defendia que o problema não é a extensão da pena ou a quantidade, mas a efetividade?

Para cada tipo penal a lei estabelece uma pena mínima e máxima, na qual deverá se orientar o julgador. Claro que, ao juiz cabe aplicar a pena justa ao fato concreto, porém, como já mencionado, de nada adianta punir se não der efetividade e executoriedade a esta punição. No caso do menor infrator, que está com sua personalidade em formação, esta regra é ainda mais pertinente, porque até mesmo na educação familiar, de nada adianta os pais corrigirem uma falta praticada pelo filho vários dias após sua ocorrência, posto que o efeito educativo não será mais o mesmo.

Como o senhor vê o papel da: Igreja, Família, Escola, Meios de comunicação? Eles são mecanismos de controle social que poderiam agir na formatação da justiça?

A pergunta é muito abrangente e ampla. Entretanto, todos sabemos da importância da família, religião e escola na educação e formação de princípios e valores que nortearão a conduta do indivíduo pelo resto de seus dias. Os avanços sociais, principalmente no aspecto religioso e familiar, com nova formatação de família (homoafetiva, concepção in vitro, mães de aluguel, etc), são mudanças que exigem adaptações sociais e da própria legislação.

Já com relação aos meios de comunicação, não há dúvida quanto a grande contribuição que vem prestando a sociedade brasileira, principalmente ao denunciar crimes graves que passam a ser apurados e que certamente ficariam sob o manto da impunidade.

Como o Senhor viu transcorrer o pleito de 7 de outubro em Brusque?

Dentro da normalidade esperada. Apesar de ter sido a primeira vez que a Justiça Eleitoral aplicou a Lei da Ficha Limpa, consigno que todas as representações que resultaram em impugnação dos registros de candidatura foram analisados e julgados dentro do prazo previsto em lei. Algumas impugnações foram objeto de recursos e outras não.

Durante o processo eleitoral também houveram denúncias, representações e investigações envolvendo propaganda e crimes eleitorais, devidamente analisados e processados.

Já o dia das eleições, novamente foi marcado pela tranquilidade, segurança e transparência, com pouquíssimos incidentes, registros e denúncias, que não macularam o trabalho incansável de todos aqueles que foram convocados pela Justiça Eleitoral, em especial, os delegados de prédio, mesários, membros da junta apuradora, serventuários, estagiários, policiais civis, militares e demais colaboradores, que permito-me enaltecer e destacar neste momento.

Para finalizar, gostaríamos que discorresse, brevemente, sobre a carreira de V.Exa.

Após me dedicar à advocacia durante quatorze anos, ingressei na Magistratura Catarinense através de concurso público realizado no ano de 1992 e tomei posse em 13-1-1993. Como Juiz Substituto judiquei nas comarcas de Itapiranga, Palmitos, Concórdia, Seara, São Miguel do Oeste, Anchieta, São José do Cedro e Dionísio Cerqueira. Já como Juiz Titular, nas comarcas de Anita Garibaldi, Maravilha, Xanxerê, Ponte Serrada (em substituição) e Brusque, onde respondo pela Vara Criminal e como Juiz Corregedor de Presídio desde o dia 17-7-2002. Atualmente também respondo como Juiz Eleitoral pela 86ª ZE de Brusque e leciono a disciplina de Direito da Infância e Adolescência no curso de Direito da UNIFEBE.

Referências

  • Jornal Em Foco. Edição de 6 de novembro de 2012.