Busca pelo ouro

De Sala Virtual Brusque
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  • Marlus Niebuhr[1].

MEMÓRIAS SOBRE O OURO EM TERRAS DE BOTUVERÁ[2]

“ ...daquele rio nós fomos embora já!!”[3]

O período de 1937 e 1938, marca o auge da corrida pelo ouro deslocando pessoas de várias regiões em busca da chamada “riqueza fácil”. No entanto, de fácil não havia nada... Sorte, trabalho duro e muita experiência eram fatores fundamentais para o sucesso.

A história do ouro remonta ao período de 1840, quando os irmãos Leslie, vindos dos Estados Unidos, iniciaram a busca pelo metal nas proximidades de um ribeirão, afluente do rio Itajaí - Mirim. Com certeza inspirado nas histórias dos primeiros colonizadores de Itajaí, que encontraram ouro na região. Notícias de precioso metal já eram registradas no ano 1651, o que explicaria o interesse dos irmãos Leslie. Mais tarde, provavelmente, inspirou muitos imigrantes da América do Norte, a criarem a famosa colônia “Príncipe Dom Pedro”, fonte de discórdia e distúrbios, instalada na confluência do ribeirão Águas Claras com o Rio Itajaí-Mirim.

O característico nome “Ribeirão do ouro”, explica este curioso momento da história de Botuverá, o ciclo de riqueza, durou pouco, em meados de 1940, a procura já havia diminuído consideravelmente.

Memórias

Memórias...

Um botuveraense que foi atraído pelo fascínio do ouro, foi a Sr. Rocco Giraldi, sua história é repleta de momentos tristes e difíceis, relembra que quando ainda era solteiro morreram sua irmã Otília, e seus irmãos Alexandre e José. Quando recebeu a notícia do falecimento de seu irmão José aos 24 anos, acometido de pneumonia; estava o Sr. Rocco “tirando ouro”, suas palavras nos remetem a uma outra época: “É aconteceu, e depois vieram me buscar. Ele faleceu sábado à noite e depois no outro dia veio um primo meu, foi me buscar lá no garimpo de manhã, chegou lá às dez horas; eu estava com dezoito anos.” Durante quatro anos, esteve buscando seu sustento no garimpo, e afirma “ dava para ganhar dinheiro, nós tirávamos 15, 16, 17 gramas por dia !!! não todo dia... Mas, tirávamos de manhã e a noite eu já vendia”, Mas, quem comprava este ouro, bem, “nas Águas Negras, a venda do Meríco, todo mundo ia lá de noite...Vendia a dez, onze cruzeiros por grama... Mas era barato”.

Nomes e lugares são citados... Histórias perdidas na memória... O Sr. Vitro Bambinetti relembra, “os Lamim acharam muito, os Pedrini também... Esse ouro eles tiravam, quando chegava sábado de meio dia eles iam lá no Alexandre Barni, que pesava, e comprava, aí eles gastavam o dinheiro lá e ele ia pra Brusque e vendia o ouro em Brusque”, mas como percebemos, havia outros compradores, “nós vendiamos para o velho Bonomini” afirmou o Sr. Germano José Palochi, que nos contou uma nova história:

...até me aconteceu uma coisa um dia, estava eu e meu irmão mais velho, nós tiravamos ouro, então nós tinhamos achado um pedacinho assim maior, eu tinha calculado... uma grama. Daí nós estavamos tirando material... mais em cima do rio. Veio lá aquele rapaz, um Scarpa, ele foi lá, fez que lavou um pouco de areia e ele me chamou e disse: olha seu Germano, eu achei um pedacinho de ouro bonito. Vou botar aqui na sua xícara,... esse pedacinho. Pode!... eu disse, quer botar, bota!! Ora, como que vou pensar que ele ia me roubar aquele ouro que nós tinhamos lá. Quando voltamos com o material, o pedacinho de ouro maior não estava mais, ele fez que ia botar e em vez de botar tirou, né [risos]. Aí, depois fui perguntar pro velho Bonomini, que era ele o comprador de ouro, e disse: -não esteve aqui esse rapaz, assim,... assim... bem conhecido de todo mundo, com um pedaço de ouro, mais ou menos de uma grama. Aí ele disse: -Teve, não pesou bem uma grama ele disse, pesou nove décimos...

O rio estava repleto de aventureiros em busca do ouro, de acordo com O Sr. Rocco a maioria eram habitantes de Botuverá, poucos de outras localidades, sua memória registra alguns garimpeiros de Curitiba, “sim, havia dois deles, por aqui... Tinha ouro para todo mundo.” O Sr. Nicolau Wietcosky relembra “ eu trabalhava nas águas do arraial, tinha uns 400 homens trabalhando por lá”. Entre estes, estava o Sr. Guilherme Comandolli, que logo foi afirmando “ cheguei a garimpar !! Oh !! daqui foi tirado muito ouro”, e o trabalho era duro “ Tirava o barro, fazia túnel e cavava até chegar lá embaixo, depois lavava numa calha...”, esse processo também é relatado pelo Sr. Claudino Comandolli, “eles cavavam, até, digamos, num material que eles conheciam, porquê tinha ouro, depois levavam no rio e lavavam dentro de uma calha. Lavava bem lavado, o que era da areia e a sujeira saía fora e o ouro ficava na calha...” cavar o tunel em busca do precioso metal não era tarefa fácil, acidentes aconteciam: “ lembro que morreu um, quando caiu uma barreira de terra e ele ficou debaixo”. De acordo com o Sr. José Tomio, “aqui no nosso lugar tinha ouro na água e no barranco também” e para encontrar se “tinha que cavar bastante, tinha que ter um braço bom para achar o ouro!!”, e durante quatorze anos ele permaneceu no garimpo. Diante dos problemas, muitos, apenas tentavam a sorte, como o Sr. Natalino Rescarolli, que resolveu ir com seu pai em busca da riqueza: “nós fomos tirar lá no Areal, lá tirar um pouco de ouro... para tirar, tinha que se ter o material, fazer uma calha e lavar, o ouro ficava e a sujeira saia...”, ficaram apenas dois meses e a cada 15 dias voltavam para casa, e num suspiro revelou “ daquele rio nós fomos embora já!!”, o sonho logo se desvaneceu e segundo o Sr. Natalino “ ninguém ficou rico, Deus me livre!! Não, não ,não!”, sem sorte, e com um lugar pouco favorável para a extração do minério, a solução foi voltar para o trabalho no campo, a lida na roça. Sua história nos lembra as do Sr. Pedro Maestri, “trabalhei, mas trabalhei poucos dias... Cerca de oito”, a busca levava a aventuras, nem sempre agradáveis...

era fogo o tempo do ouro, fomos para o mato, ficamos perdidos, os caras inventaram dizer vão em tal lugar, na tal grota... se perdemos lá dentro, se perdemos... lá não tinha lugar pra sair, era só cobras, quando era noite, nós começamos a correr para ver se encontravamos um rancho... em cima de uma pedra, uma cobra enrolada...quase!!! Se via oito, dez, doze, quinze por dia.

Seguindo os passos de seu pai, o Sr. Guilherme Araldi, buscou o garimpo, “lá pelos lados do município de Gaspar... Acharam ouro, mas era um fim de mundo o ouro que tinha ... Mas olha, aqueles que foram daqui, e que tiraram muito ouro, morreram todos pobres”. A história se repete, de entrevista em entrevista, aqueles poucos afortunados perdiam toda a riqueza, vejamos: “se pegava um táxi de lá, vinha até aqui, aí fazia de tudo nesses botecos e gastava tudo assim. Mas, morria pobre que nem um rato”. Ainda sobre este assunto o Sr. Claudino Comandolli nos revela, “no Ribeirão do Ouro, meu Deus, mas como acharam ouro ali. Então aquele pessoal fazia farra, bebia cachaça, torrava tudo, porque ganhava fácil, e acabou-se o ouro, acabou o dinheiro também, e ficaram na miséria. A maioria deles”.

Para aprofundar conhecimentos sobre o tema sugerimos a leitura do capítulo - “Nos caminhos do ouro: uma história de sonhos e esperança – publicado no livro: “Memórias de Porto Franco... Botuverá: sua história”.

Referências

  1. Historiador, Diretor de Patrimônio Histórico de Brusque.
  2. Este texto é um fragmento do original publicado no livro: “Memórias de Porto Franco... Botuverá: sua história”. Blumenau: Nova Letra,2005. Autor Marlus Niebuhr.
  3. RESCAROLI, Natalino Entrevistado em 11 de novembro de 1999.Botuverá, arquivos: CEDOM